CARALHOTAS DE ALMEIRIM | ALMEIRIM
“O verdadeiro pão de Almeirim não é
amassado com máquinas. É com braços. Os antigos comiam este pão. Estavam uma
semana inteira com este pão tapado, abafado, naquele tempo era muita a fome. O
meu pão, por exemplo, continua à antiga. É amassado à mão, fica todo cheio por
dentro, sem buracos. Continuo à antiga enquanto puder.”
(D. Emília, padeira mais popular de
Almeirim)
Na linguagem popular dos almeirinenses, chama-se “caralhotas” aos borbotos das camisolas de lã. Mas como é que surge a analogia com o pão? Segundo a tradição oral, por finais do século XIX e inícios do século XX, uma senhora estava a cozer pão enquanto uma das filhas raspou o alguidar de barro e, com os restos da massa, fez uma bola que lançou para dentro do forno. À pergunta da mãe sobre o que estava a fazer, respondeu “uma caralhota, mãe!”.
As Caralhotas de Almeirim são hoje o pão típico desta
região ribatejana.
Arredondadas, com um diâmetro médio de 15 cm, o miolo prima
por ser cheio e rústico e a côdea estaladiça, resultado de um trabalho
totalmente manual da amassadura, até a massa ficar elástica, começar a fazer
bolhas e despegar-se do alguidar que tem de ser de barro.
Os ingredientes todos misturados e amassados são a farinha
de trigo, o fermento de padeiro ou massa que ficou de véspera a levedar (o “pão
acrescentado”), água e sal. Esta massa é levedada ao som de benzeduras e
dizeres populares repetidos ao longo dos tempos, para trazer sorte e garantir
que o pão cresça. Depois é cozida durante 10 a 15 minutos, nos fornos
tradicionais a lenha de eucalipto, pinho e sobro, que existirão em Almeirim
desde o século XVI.
A Caralhota aparece assim como uma forma de não desperdiçar
restos, sobretudo numa época em que eram escassos os recursos, com o pão a ser feito
em casa semanalmente, com o cereal que cada um cultivava e guardado o resto da
semana em sacos de pano. Por outro lado, não aproveitar esses restos de massa era
quase despautério, porque “o pão foi Deus que deu” para alimentar a família.
Com o aumento do número de restaurantes em Almeirim, derivado
à fama de outras iguarias gastronómicas do concelho, as Caralhotas passaram também
a ser uma das imagens de marca da terra, ao servir de complemento para
acompanhar a Sopa da Pedra, o que fez disparar a venda deste pão. Igualmente, o
próprio nome vem suscitando a curiosidade de muitos forasteiros que são grande
parte da clientela nas padarias da terra ou em feiras onde o concelho está
representado. Em suma, referência da gastronomia local e com mérito patrimonial,
as Caralhotas de Almeirim acabaram por ser também um produto essencial no
desenvolvimento socioeconómico do município.
Desde 2020 (conforme Despacho nº 7814/2020, de 7 de
agosto), as Caralhotas de Almeirim passaram a ter garantia de qualidade
diferenciada através da proteção à denominação e indicação geográfica circunscrita
a este concelho.
Atualmente e em consequência da procura verificada, para além do pão arredondado que permanece o característico, passou a ser também possível encontrar Caralhotas na variante recheada com sabores de outros ingredientes regionais a gosto, adocicados ou salgados.
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